Jerónimo de Sousa, 18 anos à frente do PCP, como Cunhal e Brejnev
Portugal tem vários sistemas fechados, o sistema do Bloco Central, o sistema dos empregos no Estado, o sistema dos sindicatos da Função Pública e dos Transportes, o sistema dos oligopólios que não quer deixar entrar outros players no mercado, como acontece no mercado de televisão e quase ia acontecendo no leilão do 5 G e o sistema da comunicação social que há muito favorece actores e interesses em virtude de um enviesamento fortemente à esquerda dos jornalistas. Curiosamente, um enviesamento à esquerda que nos últimos anos foi combatido com um enviesamento à direita de outros sectores do jornalismo, deixando a profissão cada vez mais depauperada de vozes independentes.
Há dois exemplos máximos na comunicação social deste enviesamento à esquerda. Um é relativo ao PCP e ao relevo que é dado a este partido, como voltou a acontecer esta semana por causa da operação de cirurgia a que o líder comunista Jerónimo de Sousa vai ser submetido.
No dia 12 de janeiro de 2022, os dois diários principais do país, o DN e o Público, fizeram desta notícia e das repercussões que tem no partido as suas manchetes. Faz-se o boletim médico de Jerónimo e lançam-se sucessores, como João Ferreira, o último faz tudo comunista, sem um rasgo luminoso, perdurando em cada palavra o monolito comunista de sempre. Não há uma interrogação na imprensa sobre o o facto de Jerónimo de Sousa ser há quase 50 anos deputado e dirigente comunista, de ser secretário-geral há 18 anos, o mesmo tempo que Álvaro Cunhal em democracia e, curiosamente, Leonidas Brejnev no PCUS. Não se coloca a perplexidade sobre os Congressos sucessivos de Jerónimo com quase 100 por cento de votos, as mesmas percentagens de Vladimir Putin e, à escala nacional do indigente André Ventura, que, pela perspectiva de deserto de valores do seu Chega, há-de conseguir ser eleito com estas percentagens por longas décadas.
A actividade política do PCP, os seus Congressos, as greves e outras movimentações sindicais da sua central sindical, a CGTP, também têm um enfoque desequilibrado na comunicação social face à diminuta força aritmética do PCP. Este enviesamento é resultado de vários factores. Foi o PCP o principal partido a fazer a resistência à ditadura e foi branqueado em 1975 o seu papel na tentativa de instaurar uma ditadura de sinal contrário, comunista, em Portugal. Muitos elementos da elite jornalística foram no passado militantes ou simpatizantes comunistas que mantiveram o respeito ao papel do Partido. Muitos outros, tendo navegado em águas maoístas e trotskistas, fizeram do PCP a memória do passado ainda possível de ser admitida e respeitada nos tempos de hoje – a que não é também alheio o branqueamento do partido no apoio a Estaline — já que deixou de ser admissível defender política e socialmente Mao Tsé Tung ou Leon Tostsky.
Outro enviesamento exuberante à esquerda diz respeito ao Livre de Rui Tavares. O tempo mediático de que este dispõe, em jornais e televisões, é totalmente desproporcionado ao seu peso eleitoral. Nas legislativas de 2019, o Livre conseguiu eleger um deputado em virtude de Joacine Katar Moreira traduzir um hino perfeito à diferenciação e à representação das minorias. Não foram nem Rui Tavares nem o programa do Livre os escrutinados. Hoje, Tavares tem a prova derradeira a 30 de Janeiro. A não eleição como deputado será a confirmação da sua irrelevância de pensamento, tal como tem demonstrado nos últimos cinco anos nos artigos que assina na última página do Público, e que são o expoente máximo da forma como alguma comunicação social leva o Livre ao colo ainda que não haja uma uma ideia nova e profunda na sua mensagem.