Pedro Nuno Santos quis arrasar as poupanças da classe média portuguesa?
Em Julho de 2014 Portugal ainda se encontrava sob a intervenção da troika e a questão da reestruturação da dívida portuguesa estava ao rubro.
Francisco Louçã, Pedro Nuno Santos, Ricardo Cabral e Eugénia Pires, todos economistas, elaboram o documento “Um programa sustentável para a reestruturação da dívida portuguesa”.
É um texto polémico que reestrutura a dívida de grandes investidores institucionais, Estados e bancos estrangeiros, que emprestaram dinheiro a Portugal, propondo rever compromissos inicialmente assumidos. Para o capitalismo internacional, a possibilidade é um quadro desastroso, que não honra compromissos inicialmente assumidos no pagamento de juros e que, se fosse aprovado, arriscava colocar Portugal na lista negra de maus pagadores.
Mas a maior polémica do documento, que muita discussão provocou na altura em Portugal, foi a questão da possibilidade de reestruturação da dívida envolvendo também pequenos investidores, na sua maioria portugueses, que compraram certificados de Aforro e do Tesouro, numa quantia à data de cerca de 12 mil milhões de euros.
No documento é referido: “Alguns dos autores deste relatório defendem ser necessário proteger os pequenos aforradores detentores de instrumentos de retalho como os Certificados de Aforro (CAs) e do Tesouro (CTs). Este tipo de investidor, que representa 6% da dívida direta, equivalente a cerca de 12,2 mM€, não configura o grau de sofisticação frequentemente atribuído aos investidores institucionais: não tem por hábito diversificar o risco; nem a jogar na volatilidade para obter mais valias com o diferencial de preços; nem ainda a fazer reservas para precaver eventuais incumprimentos dos emitentes. Assim, justifica-se que o desenho da reestruturação crie uma situação de exceção com um objectivo idêntico, por exemplo, à proteção dos pequenos depositantes que usufruem de garantias sobre os depósitos inferiores a €100 000”.
Como se conclui desta parte do documento, houve subscritores do mesmo que defenderam no grupo de trabalho que os pequenos aforradores, maioritariamente portugueses da classe média, deviam ter um regime distinto do dos grandes investidores institucionais. O que não impedia porém de verem a sua dívida ao Estado português também reestruturada.
Mas havia no grupo de trabalho posições extremas, que defendiam tratamento igual dos pequenos aforradores aos grandes investidores, como também se refere no documento.
“Opinião diferente é a de que o tratamento diferenciado de pequenos aforradores em CA e CT poderia por em causa o processo de reestruturação de dívida, por um lado porque exige o refinanciamento de cerca de 12,2 mM€ entre 3 e 6 anos e, por outro lado, cria um precedente negocial para os credores que exijam um tratamento preferencial, nomeadamente os credores do Sector oficial. Portanto, esta é uma questão que terá de ser analisada em maior detalhe”, lê-se no texto.
Qual foi a posição de Pedro Nuno Santos, o recém eleito secretário-geral do PS? Até hoje não se sabe.
Mesmo que adoptada no documento uma excepção para os pequenos investidores, o facto é que se defendia, aparentemente, o limite até aos 100 mil euros de investimento em certificados.
Acima desta quantia, os Certificados de Aforro e do Tesouro dos pequenos investidores seriam reestruturados da mesma forma que os grandes investidores institucionais.
O documento explica como seria esse tratamento diferenciado, em que os certificados de aforro “não estariam sujeitos à oferta de troca por Novas Obrigações do Tesouro”, como aconteceria em relação aos grandes investidores institucionais: “os CA e os CT não seriam incluídos no processo descrito no Ponto 5.2., e portanto não estariam sujeitos à oferta de troca por Novas Obrigações do Tesouro. Dessa forma: • Os Certificados de Aforro e os Certificados de Tesouro existentes seriam declarados nulos; • Seriam emitidos Novos Certificados de Aforro (NCT), com cupão de 1% e maturidade de 3 anos (40% do valor facial total de Certificados de Aforro e de Certificados de Tesouro) e de 6 anos (60% do valor facial total de Certificados de Aforro e de Certificados de Tesouro). • Aos detentores de Certificados de Aforro e de Tesouro seria oferecido a troca pelos Novos Certificados de Aforro (NCT). • Aos pequenos aforradores que decidam reinvestir os NCT de maturidade a 3 anos por mais 3 anos será oferecido um prémio de permanência, sempre que a taxa de crescimento real do PIB for superior a 1.5%, equivalente ao diferencial entre a taxa de crescimento do PIB e aquele limiar mínimo, até um máximo de 2%”
Pode ler o documento na íntegra no seguinte endereço electrónico:
https://www.esquerda.net/sites/default/files/relatorio_divida_7_julho_completo.pdf