António Costa, o senhor Merkel
Ainda não se sabe se António Costa é candidato às legislativas de 2023. Se for, iguala Cavaco Silva, que se candidatou três vezes a primeiro-ministro, em 1985, 87 e 91. Mas, se se candidatar e ganhar, bate Cavaco, que só governou dez anos.
Em 1995 Cavaco não se recandidatou a primeiro-ministro e lançou Fernando Nogueira. Este perdeu para António Guterres.
Cavaco teria ganho a Guterres se se tivesse candidato? Muito possivelmente? Em 1995, o cavaquismo não tinha o brilho de 1987 e 1991 mas a capacidade executiva de Cavaco era ainda muito confiável. O tabu, se saía ou não saía, que a comunicação social de esquerda alimentou à exaustão, o excesso de confiança no lançamento de Nogueira, a descolagem rasteira que fez deste, perto das legislativas, só pensando no seu caminho presidencial, comprometeram Cavaco junto do eleitorado. Tanto que perdeu as presidenciais de 1996 para Jorge Sampaio.
A partir de um determinado limite os portugueses não gostam de sentir que um político pensa tê-los completamente na mão e os conduz como se fossem um rebanho.
O que aconteceu a Cavaco em 1995 é um bom exemplo para Costa.
Cenário 1: Costa é recandidato em 2023
É claro que é preciso o costismo não perder o brilho. Mas o PS sabe tão bem como o PSD mostrar obras de propaganda meses antes das legislativas de 2023. Um dos trunfos é o Plano de Recuperação e Resiliência, o investimento público e o seu efeito multiplicador na economia. O outro trunfo é o eleitorado cada vez mais dependente dos apoios do Estado e do emprego público (este último tem vindo a aumentar) na era pós-Covid, eleitorado que bem sabe que o PS é o seu anjo protector (mais a geringonça).
Quem será o Guterres do PSD em 2023 é ainda uma incógnita. Para muitos, o D. Sebastião laranja é Passos Coelho. Mas, tal como podia ter acontecido ao rei hermafrodita se tivesse realmente regressado de Alcácer-Quibir, Passos pode ser mal recebido porque a memória de ter ido além da troika ainda está muito fresca. Até o mentor de Passos Coelho, Ângelo Correia, pôs recentemente a hipótese do seu pupilo ter sido devoto à troika, prisioneiro de um síndrome de Estocolmo (a política é mesmo o reino do fel e do transformismo).
Passos à parte, a nova vida dos laranjinhas será difícil por causa do Chega e da Iniciativa Liberal a comerem-lhe votos. Daí, os ensaios de geringonça do PSD com o partido de André Ventura. O PS libertou o monstro quando fez em 2015 um acordo de governo com os homens que apoiaram os golpistas soviéticos de 1991 contra Gorbatchov. O PSD paga-lhe na mesma com o lúmpen da política. Pouco importa que o país fique nivelado por baixo.
Em suma, Costa pode ganhar, bater o recorde de governação e ser uma espécie de senhor Merkel, até no equilibrismo da alemã Angela que esteve 16 anos no poder.
Cenário 2: Costa não é recandidato em 2023
Em 2023, qualquer candidato socialista sem carreira própria será visto como depositário da confiança de Costa.
Mas uma coisa é o original, outra coisa será uma cópia sem créditos firmados. Como aconteceu com Nogueira. Mesmo que o costismo esteja confiante na vitória sem Costa, como estava o cavaquismo sem Cavaco, o caminho é difícil. Mesmo com propaganda e o PRR.
Pedro Nuno Santos é, sobretudo, uma criação artificial da comunicação social de esquerda. Como Fernando Nogueira era da imprensa de direita em 1995. Com a agravante que Santos tem laivos de Vasco Gonçalves e Hugo Chávez e o povo português provou em 1975 na Fonte Luminosa que rejeita populistas de esquerda.
Se Costa tiver a tentação de sair de primeiro-ministro e ser candidato presidencial em 2025, tudo pode ser pior. Será, como aconteceu, com Cavaco, passar os limites da paciência do rebanho.