Gouveia e Melo, Sidónio Pais e Salazar
António Campos, o militante nº 1 do PS, homem que foi durante décadas o braço-direito de Mário Soares completa o puzzle de muitas histórias sobre o PS e o ex-primeiro-ministro e ex-Presidente da República, numa entrevista fundamental ao jornal “Público” de 01-12-2024.
Conta, por exemplo, que um avião com dinheiro da Alemanha, enviado pelo chanceler Helmut Schmidt, impediu o fecho do Banco de Portugal e que a primeira coisa que Soares fez no 25 de Novembro de 1975 foi telefonar a Melo Antunes, redactor do Documento dos Nove, para que o PCP não fosse ilegalizado, considerando que o grande perigo era a extrema-direita.
Campos revela, ainda, que fez a campanha de Maria de Lurdes Pintasilgo nas eleições presidenciais de 1986, paralelamente à de Mário Soares (com cartazes e donativos) e que impediu a ex-primeira-ministra de desistir, o que podia ser fatal para Soares, com o risco de ser Salgado Zenha a disputar a 2ª volta da eleição com Freitas do Amaral.
Mas o dado mais significativo da entrevista de Campos foi quando disse que “Mário Soares era um homem muito culto, conhecia muito bem a história de Portugal, conhecia muito bem o povo português. O Mário Soares tinha uma intuição brutal e não acreditava na cultura democrática do povo português”, acrescentando que a sua grande preocupação no 25 de Abril era como é que “institucionalizava a democracia em Portugal. Era sempre a grande preocupação dele. Mário Soares tinha a ideia de que o que se estava a passar, com os aplausos da população, era uma coisa emocional e não era cultural. Não era uma coisa de cultura, era de emoção”.
Esta memória analítica de Campos sobre Soares é hoje muito actual, numa altura em que o Almirante Gouveia e Melo aparece em primeiro lugar nas sondagens para as próximas eleições presidenciais. “Não é uma coisa de cultura mas sim de emoção”, como também ocorreu quando Sidónio Pais tomou o poder em 1917, idolatrado pelo povo, ou quando Salazar chegou ao governo em 1928 e o manteve durante 40 anos, algo só possível com um grande apoio popular.