“Não será digno dos nossos mortos, quem não entender que tudo deve ser sacrificado à defesa das colónias”
Já por aqui se disse que está por fazer o legado histórico de Adriano Moreira.
Adriano Moreira apoiou em 1961 a política de Salazar de manutenção a todo o custo das províncias ultramarinas através de uma guerra colonial que durou 13 anos e fez dez mil mortos e 30 mil feridos.
Adriano Moreira também apoiou Salazar contra o general Botelho Moniz. Este realizou em 13 de Abril de 1961 um golpe palaciano falhado, apoiado pelos EUA, que queria depor Salazar, acabar com a guerra colonial à nascença e democratizar Portugal.
Esta realidade tem sido sistematicamente menorizada por causa de dois acontecimentos que criam enviesamento à análise histórica, tendo, aliás, facilitado a integração de Adriano Moreira no regime democrático.
O primeiro acontecimento é a prisão de Adriano Moreira pela PIDE em 1949 por se atrever a acusar o ministro do Exército Santos Costa do homicídio involuntário do general Marques Godinho, de quem era advogado. Este general opôs-se a Salazar e morreu na prisão por ataque cardíaco. Adriano Moreira tinha alertado que Marques Godinho necessitava de condições prisionais especiais por ser doente cardíaco, o que não foi atendido.
Estes problemas de Adriano Moreira com o regime não evitaram, porém, ser nomeado Subsecretário de Estado da Administração Ultramarina em 1959.
O segundo acontecimento é o pedido de demissão de Adriano Moreira de ministro Ultramar, um ano e meio após a tomada de posse, por Salazar discordar da sua política de revogação do Estatuto do Indigenato, que impedia os africanos das colónias de acederem à cidadania portuguesa, e outras medidas que visavam reforçar os seus direitos.
Esta divergência com Salazar não inviabilizou que os dois comungassem da necessidade da guerra colonial e da sua intensificação, defendessem uma emigração maciça de colonos brancos para as colónias, sobretudo Angola e Moçambique e adoptassem um discurso neo-colonista que, objectivamente, era defensor de uma supremacia branca.
Nos discursos de Adriano Moreira poucos meses após se tornar ministro do Ultramar, falando da guerra colonial e do massacre de colonos brancos de 15 de Março de 1961 (após o assalto de nacionalistas angolanos a diversas instalações de segurança e prisionais portuguesas em 4 de Fevereiro de 1961 e a retaliação portuguesa que matou centenas de africanos nos musseques ainda em Fevereiro de 1961) é notório o alinhamento de Adriano Moreira com o regime salazarista.
O Objectivo publica extractos de dois discursos de Adriano Moreira inseridos no livro “Batalha da Esperança”, que reúne várias intervenções do então ministro do Ultramar, publicado em 1962 pela editora Panorama:
Discurso proferido na sessão do Conselho Legislativo de Angola efectuada em 2 se Maio de 1961
“(…) Ninguém no mundo pode esperar que deixemos de usar de todos os meios ao alcance do nosso poder para destruir aqueles que se conjuraram para liquidar um grupo inteiro de um povo pacífico (…) a nação está disposta a por ao serviço da sua projeção ultramarina todos os recursos ao seu dispor, e podemos testemunhar a decisão e ardor com que na metrópole se procede à mobilização dos meios existentes. Só não será feito o que não puder ser feito, e só não lançamos nesta cruzada aquilo que não estiver ao nosso alcance (…) não será digno do seu esforço, nem dos nossos mortos, quem não entender que tudo deve ser sacrificado a este objectivo primário [Defesa, Ordem e Segurança nas colónias], e não der em tal sentido a cooperação que lhe for solicitada. (…)”
Discurso proferido em 19 de Maio de 1961, em Angola, aos microfones dos Emissores de Luanda.
“(…) A todos nos cabe suportar os sacrifícios impostos pelo ataque a qualquer das parcelas nacionais, sem que nenhum tenha legitimidade para solicitar que o dispensem ou aliviem dos encargos impostos pela salvação comum (…)”
Discurso proferido em 28 de Agosto de 1961 na Associação Comercial do Porto
“(…) Consideramos que a África ficou enriquecida quando ali implantámos a ideia de Estado e de Pátria, a que eram alheios os seus povos, e que constituiu para ela um incalculável benefício a circunstância de alguns dos seus territórios ficarem integrados numa unidade política, com povos europeus que lhes puderam fornecer aquilo de que careciam e que durante muito tempo não poderiam alcançar por si próprios . Em suma, entendemos que a fórmula portuguesa é a mais benéfica para a África ao sul do Saara (…) não duvidamos da superioridade do conceito com que sempre encarámos as necessidades dos territórios africanos, nas quais vimos sólido fundamento para promover a fixação definitiva do português europeu nas terras do Ultramar, onde não vai mercadejar um serviço, vai, muito pelo contrário, viver a sua vida normal, servindo, com os aborígenes, a mesma pátria e, portanto, interesses comuns (…) Por isso entendemos que deve ser incrementado o povoamento da nossa África por elementos europeus que ali estabeleçam o seu lar e encontrem a verdadeira continuação da Pátria. Em relação às nossas províncias não se trata, aliás, de uma política nova, trata-se de reconhecer que cada vez há mais razão para seguir a política de sempre(…)”