Os “nove” que escolheram o primeiro Presidente da República eleito após o 25 de Abril
Foram nove os militares do Conselho da Revolução, pertencentes ao Exército, que se reuniram formalmente em princípios de Janeiro de 1976 no Forte de São Julião da Barra para escolher o candidato às eleições presidenciais desse ano, com a quase certeza que os dois principais partidos políticos, o PS e o PSD o apoiariam. Nove parece um número mítico do período do PREC e do período de transição da democracia portuguesa. Também foram nove os subscritores do chamado “Documento Melo Antunes” de 7 de Agosto de 1975, passado à História como Documento dos Nove, o texto político de vários militares do Conselho da Revolução contra a linha gonçalvista e a linha otelista do MFA que foi percursor do 25 de Novembro. Há, aliás, militares que estão nestes dois Grupos dos Nove, rumo à normalização da democracia portuguesa, seguindo o modelo ocidental, designadamente Melo Antunes, Vasco Lourenço, Franco Charais, Pezarat Correia e Vitor Alves.
É o então capitão Sousa e Castro, um dos presentes na reunião, quem conta no livro Capitão de Abril, Capitão de Novembro (Editora Guerra e Paz, Lisboa 2009) o que se passou, quem eram os candidatos e como Ramalho Eanes se tornou o candidato mais votado para concorrer à Presidência da República nas eleições de 27 de Junho de 1976.
“Após várias considerações e reuniões parcelares entre conselheiros da Revolução, chegou-se a uma reunião formal de elementos do Exército, para indigitar quem seria o futuro candidato a Presidente da República de Portugal. Essa reunião tem lugar em São Julião da Barra e nela estão presentes Vasco Lourenço, Melo Antunes, Vítor Alves, Pezarat Correia, Franco Charais, Marques Júnior, eu, o general Eanes e Pires Veloso. Nessa reunião, são discutidos abertamente os vários cenários e as várias personalidades militares que poderiam aceder ser candidatos à presidência. Em princípio, quem viesse a ser indigitado teria de certeza o apoio das forças partidárias mais representativas. Essas forças apostavam num militar para garantir a estabilidade política e o apaziguamento das Forças Armadas, de modo a dar segurança ao processo democrático. Foram discutidos os perfis das pessoas, de modo a avaliar as vantagens e inconvenientes, incluindo dois possíveis candidatos que estavam na reunião: o general Ramalho Eanes e o coronel Pires Veloso (…) A outra hipótese que foi discutida foi a do tenente-coronel Costa Brás, cujo proponente principal foi Vasco Lourenço. Este, para não melindrar Ramalho Eanes, argumentava que era mais importante naquela conjuntura, estamos no início de 1976, o desempenho do cargo de chefe de Estado-Maior do Exército do que do cargo de Presidente da República. Por sua vez, Pires Veloso concordava parcial e tacticamente com Vasco Lourenço, porque ele próprio, apesar das suas anteriores afirmações, ambicionava ser nomeado e argumentava ainda com uma justificação um pouco naif dizendo que um futuro Presidente da República teria de saber falar inglês. Finalmente, após ter sido liminarmente posta de lado a hipótese Pires Veloso, dos nove conselheiros presentes, sete pronunciaram-se a favor de Ramalho Eanes e apenas dois apoiaram Costa Brás.”