Zmar: somos uma caixinha de surpresas
Não, não se bate numa pedra e encontra-se ouro ou petróleo em Portugal. É mais cada tiro cada melro. De repente, num país que tem uma vida aparente e outra subterrânea, descobrem-se por causa de um surto de Covid cerca de 13 mil trabalhadores, maioritariamente asiáticos, muitos deles clandestinos, a viver em condições deploráveis em Odemira.
Como se descobriu a vida de Sócrates, como se descobriu o BPN, o Banif e o BES, como surgiram, apocalípticos, os dias dos incêndios de 2017 perante um país impreparado ou como um médio surto de Covid em Janeiro de 2021, rompeu o Sistema Nacional de Saúde.
Ou como medram novos escândalos ainda não devidamente conhecidos mas se advinham, como a TAP, as longas moratórias, as culturas intensivas em várias partes do país com fortes danos para o meio ambiente, oliveiras, abacate, cultura da cannabis.
O governo da gerigonça, incomodado com uma situação em que a sua ideologia é posta à prova, reagiu à maneira zénite do Bloco de Esquerda e do PCP. Requisição civil para cima da unidade hoteleira Zmar, de modo a criar uma cerca sanitária para os trabalhadores portadores do Covid. Os proprietários contestaram o governo, apoiados pelo bastonário da Ordem dos Advogados, Menezes Leitão, mais na sua qualidade de presidente da Associação de Proprietários (Lisbonenses). A procissão ainda vai no adro.
A propriedade em Portugal é sagrada, invoque-se a saúde ou a legitimidade revolucionária. Em 1975, perante a avalanche colectivizadora do PCP e da extrema esquerda, a maioria silenciosa respondeu com uma vitória eleitoral esmagadora do PS.
Hoje, e ao contrário do que se possa pensar, Portugal é ainda mais conservador do que em 1975. Uma coisa é votar à esquerda e criar geringonças, assegurando que o bodo do Estado corre com mais força no emprego público e em ajudas variadas . Outra coisa é tocar na propriedade sagrada, num país que é o que tem mais casas por mil habitantes da OCDE. Daí que seja perigoso ao PS afastar-se da sua marca moderada de origem.