Quando a irmã Lúcia ajudou Salazar no momento difícil da vitória dos Aliados
A II Guerra Mundial tinha acabado há seis meses e o presidente do Conselho António de Oliveira Salazar continuava muito pressionado pelas oposições para fazer aberturas democráticas no regime, num momento em que a vitória dos Aliados no conflito cimentava a democracia na Europa.
Numa carta datada de 13 de Novembro de 1945, dirigida ao Cardeal Manuel Cerejeira, reenviada por este a Salazar, a irmã Lúcia, já a viver no Carmelo de Fátima, fazia assim o panegírico do ditador português:
“(…) o Salazar é a pessoa por Ele (Deus) escolhida para continuar a governar a nossa Pátria, … a ele é que será concedida a luz e graça para conduzir o nosso povo pelos caminhos da paz e da prosperidade.
É preciso fazer compreender ao povo que as privações e sofrimentos dos últimos anos não foram efeito de falta alguma de Salazar, mas sim provas que Deus nos enviou pelos nossos pecados. Já o bom Deus ao prometer a graça da paz à nossa nação nos anunciou vários sofrimentos, pela razão de que nós éramos também culpados. E na verdade bem pouco nos pediu, se olharmos para as tribulações e angústias dos outros povos.”
Lúcia, de personalidade dúbia e arisca, que tanto elogia como desfaz, não deixa Salazar sem uma ferroada no final.
“Depois é preciso dizer a Salazar que os víveres necessários ao sustento do povo não devem continuar a apodrecer nos celeiros, mas serem-lhe distribuídos.”
O cardeal Cerejeira enviou o trecho desta carta de Lúcia a Salazar (que faz parte do Arquivo Salazar na Torre do Tombo”, com um pequeno escrito pessoal para o presidente do Conselho:
“Nesta hora de tantas preocupações, desgostos e talvez dúvidas para ti, envio-te este trecho de uma carta da Irmã Lúcia, vidente de Fátima, que acabo de receber. Deve levar-te muita consolação e confiança. E se a tu a lesses toda, mais consolado e confiado ficarias. Escuso de dizer que isto que ela diz, o não diz dela mesma, mas por indicação divina (segundo ela deixa entender). Tenho pressa em to fazer chegar às mãos”.
Portugal era assim, um país do século XX que parecia viver no Antigo Regime do século XVII.