Salazar e a NATO: “democracia é forma gasta e perturbadora”

Salazar colocou Portugal na NATO em 1949, mesmo com o Preâmbulo da organização a exigir o respeito pelos princípios democráticos. Os outros parceiros, todos democracias, também fecharam os olhos.
Portugal entrou para a NATO a 4 de Abril de 1949, sendo um dos membros fundadores da organização. A justificação da sua entrada teve exclusivamente a ver com o quadro de guerra fria e luta contra o comunismo que já se vivia no mundo, apenas quatro anos após o fim da II Guerra Mundial. Um dos factores que contribuiu fortemente para Portugal ser aceite como membro da NATO residiu na necessidade de fazer frente ao expansionismo da URSS no Leste da Europa e de a China, através de Mao Tsé Tung estar também prestes a abraçar também a ideologia comunista (o que aconteceria em 1 de Outubro de 1949). Outro dos factores respeitou à posição estratégica portuguesa na Costa Atlântica, sobretudo tendo em conta a Base das Lages nos Açores.
Segundo o Preâmbulo da organização de defesa militar, Portugal, que vivia em plena ditadura de Salazar há 15 anos, não respeitava os princípios do Tratado, no que respeita à democracia, às liberdades individuais e ao respeito pelo Direito.
O Preâmbulo do Tratado, ainda hoje vigente, é o seguinte:
“Os Estados Partes no presente Tratado, Reafirmando a sua fé nos instintos e princípios da Carta das Nações Unidas e o desejo de viver em paz com todos os povos e com todos os Governos;
Decididos a salvaguardar a liberdade, a herança comum e a civilização dos seus povos, fundadas nos princípios da democracia, das liberdades individuais e do respeito pelo direito;
Desejosos de promover a estabilidade e o bem-estar na área do Atlântico Norte;
Resolvidos a congregar os seus esforços para a defesa colectiva e para a preservação da paz e da segurança: acordam no presente Tratado do Atlântico Norte”
Dos doze países fundadores, só Portugal não era uma democracia, e todos fecharam os olhos ao regime ditatorial português, de partido único, sem liberdade de expressão e com uma polícia política que torturava comunistas e outros opositores ao regime.
Ironicamente, Salazar, que nunca foi um democrata, também fechou os olhos ao Preâmbulo da organização.
Num discurso na Assembleia Nacional a 25 de Julho de 1949, justificando a entrada na NATO, disse aos deputados da União Nacional que o Preâmbulo “sofre de vacuidade ou imprecisão de certas formas já gastas e perturbadoras”. In Salazar Discursos Vol. IV p. 410 , Discurso na Assembleia Nacional a 25 de Julho de 1949